terça-feira, 29 de dezembro de 2020

(Em texto)O 2020 do Papa Francisco: a força da oração em tempos de pandemia

A emergência de saúde mundial da Covid-19 interrompeu as viagens internacionais este ano, mas o Pontífice sempre se manteve próximo aos fiéis graças à força da oração.


                                                                                    Isabella Piro/Mariangela Jaguraba – Vatican News


Domingo, 8 de março de 2020: a linha divisória que separa o “antes” e o “depois” passa por esta data. É o dia do primeiro Angelus do Papa Francisco recitado, ao vivo em áudio-vídeo, da Biblioteca do Palácio Apostólico. O confinamento imposto pela pandemia da Covid-19 é iminente. “É um pouco estranha esta oração do Angelus de hoje, com o Papa 'engaiolado' na Biblioteca, mas vejo vocês, estou próximo a vocês”, disse Francisco, no início da transmissão. Depois, no final, um fora de programa: o Papa vai à janela do Palácio Apostólico para abençoar a Praça São Pedro. Ainda não se sabe, mas aquela praça, ao longo dos meses, ficará vazia e silenciosa; será preenchida com a oração do Pontífice e as esperanças do mundo. É ali, que debaixo de chuva, Francisco preside, na noite de 27 de março, sexta-feira da Quaresma, o Momento extraordinário de oração em tempos de pandemia para convidar a humanidade a não ter medo e a confiar-se ao Senhor: “Temos uma esperança: em sua cruz fomos curados e abraçados para que nada e ninguém nos separe de seu amor redentor”, disse ele.


A oração e a emergência de saúde também retornam nas catequeses das Audiências Gerais de 2020: à primeira, o Papa dedica todo um ciclo que começa em 6 de maio e recomeça em 7 de outubro. A partir do mês e agosto, o Pontífice reflete sobre o tema “Curar o mundo”, lembrando em particular, na quarta-feira 19, a importância do acesso universal à vacina. Um terceiro ciclo de catequeses, de janeiro até o final de abril, foi dedicado às Bem-Aventuranças. Até 31 de dezembro próximo, serão um total de 46 audiências gerais, este ano, e 58 as vezes em que o Papa rezará o Angelus e o Regina Coeli, encontrando a ocasião para lançar numerosos apelos pela paz. 


Prevalece, porém, a exortação de 19 de julho: “Renovo o apelo por um cessar-fogo global e imediato, que permita a paz e a segurança indispensáveis para fornecer a assistência humanitária necessária.” De 9 de março a 18 de maio, as igrejas na Itália foram proibidas de celebrar com a presença do povo e o Pontífice autorizou a transmissão áudio-vídeo ao vivo da missa por ele presidida todas as manhãs às 7h na Casa Santa Marta. A última transmissão ao vivo realizou-se da Basílica Vaticana na manhã de 18 de maio, centenário do nascimento de São João Paulo II.


2020 foi também o ano da terceira Encíclica do Papa Francisco: em 4 de outubro, foi publicada a “Fratelli tutti”, na qual o Pontífice indica a fraternidade e a amizade social como vias primárias para construir um mundo melhor. Antes, em 12 de fevereiro, foi divulgada a Exortação Apostólica “Querida Amazônia”, fruto do Sínodo Especial para a Região Pan-amazônica, realizado em outubro de 2019. O texto representa o desejo de Francisco de uma Igreja com rosto amazônico e traça novos caminhos de evangelização e de cuidado do meio ambiente. Não por acaso, este ano também se celebra o quinto aniversário da segunda Encíclica do Papa Francisco, “Laudato si”, celebrada, em 18 de junho, com o documento “A caminho para cuidar da Casa comum”, preparado pela Mesa Inter-dicasterial da Santa Sé sobre ecologia integral e destinado a interpelar todo cristão a uma relação saudável com a Criação. Em 24 de maio, foi lançado um especial “Ano da Laudato si'”, e em 12 de dezembro, o Papa Francisco enviou uma mensagem em vídeo aos participantes da “High Level Virtual Climate Ambition Summit” (Cúpula Virtual de Alto Nível sobre Ambição Climática), conferência de vídeo climática da ONU para reiterar o compromisso do Vaticano de reduzir a zero as emissões de gases de efeito estufa antes de 2050.


Entre as Cartas Apostólicas de 2020, destaca-se a “Patris corde”, divulgada em 8 de dezembro, há 150 anos da declaração de São José como Patrono da Igreja Católica feita pelo Beato Pio IX. Para a ocasião, foi anunciado pela Penitenciaria Apostólica um especial “Ano de São José”, que se concluirá em 8 de dezembro de 2021. No Angelus de 27 de dezembro, Francisco anunciou que em 19 de março de 2021 será inaugurado o Ano “Família Amoris Laetitia” que se concluirá em 26 de junho de 2022, com o 10º Encontro Mundial das Famílias, programado para Roma. O ano que se aproxima do fim também contou com algumas celebrações especiais presididas pelo Pontífice: em 26 de janeiro, na Basílica Vaticana, realizou-se a Missa do primeiro Domingo da Palavra de Deus, instituído pelo Papa em 2019. Na noite de 10 de abril, a Praça São Pedro foi o cenário da Via-Sacra, escrita pelos detentos da prisão “Due Palazzi”, em Pádua. No final do rito, o Papa não faz nenhum discurso, mas seu silêncio orante foi mais forte do que qualquer palavra. O mesmo silêncio, cheio de fé, o acompanharia, meses depois, na Praça de Espanha, em Roma: no amanhecer de 8 de dezembro, Solenidade da Imaculada Conceição, o Papa se deteve em oração aos pés da imagem da Virgem.


Em 12 de abril, Páscoa da Ressurreição, a Basílica Vaticana estava vazia: o Papa presidiu a Missa na presença de poucas pessoas e pronunciou a Urbi et Orbi diante do Altar da Confissão. Naquele dia, o drama de Cabo Delgado, Moçambique, chegou à atenção internacional. Dentre os vários apelos à paz que Francisco lança em sua Mensagem à cidade e ao mundo, há também uma para a província situada no norte do país africano, cenário há três anos de conflito violento. Naquele momento, é como se o Papa colocasse Cabo Delgado no mapa do mundo. No dia 22 de novembro, Solenidade de Cristo Rei, a Basílica Vaticana também recebeu a cerimônia de entrega da Cruz e do Ícone Mariano, símbolos da Jornada Mundial da Juventude,1 entre os jovens do Panamá, país anfitrião da JMJ 2019, e os jovens de Lisboa, cidade que sediará o evento em 2023. Para a ocasião, o Papa estabeleceu que a celebração diocesana da JMJ seja transferida do Domingo de Ramos para o Domingo de Cristo Rei.


Do ponto de vista das reformas, no ano que está chegando ao fim, Francisco assinou vários documentos: em março, promulgou a lei CCCLI sobre o sistema judiciário do Estado da Cidade do Vaticano, que substituiu a que estava em vigor desde 1987, dando maior independência aos magistrados. Em 1º de junho, foi a vez do Motu proprio “Normas sobre transparência, controle e concorrência dos contratos públicos da Santa Sé e da Cidade do Vaticano”, seguido, em 5 de dezembro, pelo novo Estatuto da Autoridade de Informação Financeira, que se torna a Autoridade de Supervisão e Informação Financeira. Por fim, em de 28 de dezembro, com o Motu proprio “Sobre algumas competências em matéria econômico-financeira”, a gestão de fundos e imóveis da Secretaria de Estado, incluindo o Óbolo de São Pedro, foi transferida para a APSA. Ao mesmo tempo, foi reforçado o papel de controle da Secretaria para a Economia que terá a função de Secretaria Papal para assuntos econômicos e financeiros. Também significativa foi, em 22 de outubro, a renovação por dois anos do Acordo Provisório entre a Santa Sé e a República Popular da China, assinada em Pequim em 2018 e relativa à nomeação dos bispos. A prorrogação foi seguida, em 24 de novembro, pela nomeação de um novo prelado, dom Thomas Chen Tianhao, que guiará a Diocese de Qingdao.


Também em novembro, na terça-feira 10, foi publicado o “Relatório sobre o conhecimento institucional e o processo de decisão da Santa Sé em relação ao ex-cardeal Theodore Edgar McCarrick”. Reconhecido como responsável pelo abuso sexual de menores e demitido do estado clerical em 2019, o ex-purpurado é objeto de um extenso dossiê que a Secretaria de Estado está elaborando a mando do Papa. O próprio Pontífice fala sobre isso na Audiência Geral em 11 de novembro: “Ontem foi publicado o Relatório sobre o doloroso caso do ex-cardeal Theodore McCarrick. Renovo minha proximidade às vítimas de todos os abusos e o compromisso da Igreja de desarraigar este mal”, disse ele. No final de 2020, a composição do Colégio Cardinalício muda: em 28 de novembro, no sétimo Consistório de seu Pontificado, Francisco criou 13 novos cardeais, chamando-os para o novo cargo das periferias do mundo: países como Brunei e Ruanda passam a fazer parte da “geografia” do Colégio Cardinalício pela primeira vez.

 

Além disso, 2020 é o ano sem nenhuma viagem internacional do Papa, que viaja apenas na Itália. Em 23 de fevereiro, ele foi a Bari para o Encontro de reflexão e espiritualidade “Mediterrâneo, fronteira de paz”. Ali, o Pontífice invocou a paz e a fraternidade, porque a guerra “é uma loucura à qual não podemos nos resignar. Nunca”. Em 3 de outubro, Francisco foi a Assis, em visita particular, e ali, no túmulo do Santo Pobrezinho, assinou a Encíclica “Fratelli tutti”, que seria lançada no dia seguinte.


Durante esses 12 meses, o Pontífice gravou numerosas vídeomensagens, dentre as quais as de 25 de setembro e 10 de dezembro. Na primeira, Francisco se dirige à 75ª Assembleia Geral das Nações Unidas e lança um forte apelo à Comunidade internacional para que ponha fim à corrida aos armamentos, proteja os direitos dos migrantes e repense os sistemas econômicos e financeiros. Ele também condenou fortemente o aborto como “serviço essencial” humanitário. A segunda mensagem em vídeo foi dirigida aos participantes do encontro promovida on-line pelo Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, sobre a crise na Síria e no Iraque. “Devemos fazer com que a presença cristã, nestas terras, continue sendo o que sempre foi: um sinal de paz, progresso, desenvolvimento e reconciliação.”


E foi o Iraque que projetou o Pontificado de Francisco para 2021: em 7 de dezembro, foi anunciada a viagem do Papa ao solo iraquiano de 5 a 8 de março próximo. Uma visita que Francisco deseja fortemente, tanto que manifestou a intenção de realizá-la em junho de 2019, na audiência aos participantes do Reunião das Obras de Ajuda às Igrejas Orientais (Roaco). Um sinal nessa direção veio em 25 de janeiro de 2020, quando o Pontífice recebeu no Vaticano Barham Salih, presidente do Iraque.  Portanto, cabe a este país construir uma ponte entre um ano que termina e outro que chega, prenúncio de novas esperanças.

 (vaticannews)


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