quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Palavra de Vida – agosto 2022


“Se o meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?” (Mt 18, 21)


O capítulo 18 do evangelho de Mateus é um texto riquíssimo, onde Jesus dá instruções aos discípulos sobre como viver os relacionamentos no seio da comunidade recém-nascida. A pergunta feita por Pedro retoma as palavras que Jesus tinha pronunciado um pouco antes: «Se o teu irmão cometer alguma falta contra ti…»[1]. Jesus continua a falar e, pouco depois, Pedro interrompe-o, como se se desse conta de não ter compreendido bem aquilo que o seu Mestre tinha acabado de dizer. Coloca-lhe uma das questões mais relevantes acerca do caminho que um discípulo de Jesus deve percorrer. Quantas vezes é preciso perdoar?


“Se o meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?”


Interrogar-se faz parte do caminho da fé. Quem acredita não tem todas as respostas, mas permanece fiel apesar das perguntas. A interrogação de Pedro não se refere ao pecado contra Deus, mas ao que fazer quando um irmão comete alguma falta contra outro irmão. Pedro julga ser um bom discípulo, que consegue chegar a perdoar até sete vezes[2]. Não esperava a resposta de Jesus que desfaz todas as suas certezas: «Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete» (Mt 18,22). Os discípulos conheciam bem as palavras de Lamec, o sanguinário filho de Caim, que canta a repetição da vingança até setenta vezes sete[3]. Jesus, fazendo justamente alusão a essa afirmação, contrapõe à vingança ilimitada o perdão infinito.


“Se o meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?”


Não é uma questão de perdoar a uma pessoa que ofende continuamente, mas antes de perdoar repetidamente no nosso coração. O perdão verdadeiro, aquele que nos faz sentir livres, acontece normalmente de forma gradual. Não é um sentimento, não é esquecer: é a escolha que o crente deve fazer, não apenas quando a ofensa se repete, mas também todas as vezes que ela volta à memória. Por isso é preciso perdoar setenta vezes sete.

Escreve Chiara Lubich: «Jesus, portanto, […] tinha como objetivo sobretudo os relacionamentos entre os cristãos, entre os membros da mesma comunidade. É, por isso, antes de tudo com os teus irmãos na fé que te deves comportar assim: na família, no trabalho, na escola ou, se vives em comunidade, na tua comunidade. Sabes bem como muitas vezes se quer compensar com um ato, com uma palavra correspondente, uma ofensa recebida. Sabes como as faltas de amor são frequentes entre pessoas que vivem próximas, quer por diferenças de caráter quer por nervosismo ou por outras razões. Então, recorda-te que só uma atitude de perdão, sempre renovada, pode manter a paz e a unidade entre os irmãos. Existirá sempre a tendência para pensar nos defeitos dos teus irmãos, para recordar o seu passado, para querer que sejam diferentes do que são… É preciso que tu cries o hábito de os ver com olhos novos, de os ver novos, aceitando-os sempre, imediatamente e plenamente, mesmo que não se arrependam»[4].


“Se o meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?”


Todos nós fazemos parte de uma comunidade de “perdoados”, porque o perdão é um dom de Deus, do qual precisamos sempre. Deveríamos viver sempre maravilhados com a imensa misericórdia que recebemos do Pai, que nos perdoa, se também nós perdoarmos aos nossos irmãos[5].

Há situações em que não é fácil perdoar. Acontecimentos que derivam de situações políticas, sociais, económicas em que o perdão pode assumir uma dimensão comunitária. São muitos os exemplos de mulheres e homens que conseguiram perdoar, mesmo nos contextos mais difíceis, ajudados pela comunidade que os apoiou.

O Osvaldo é colombiano. Foi ameaçado de morte e viu o seu irmão ser assassinado. Atualmente é dirigente de uma associação rural, onde se ocupa da recuperação de pessoas que tinham estado diretamente envolvidas no conflito armado do seu país.

«Teria sido fácil responder à vingança com outra violência, mas recusei», explica o Osvaldo: «Aprender a arte do perdão é muito, muito difícil, mas as armas ou a guerra nunca podem ser opção para uma mudança de vida. A estrada da transformação é outra, é poder tocar a alma humana do outro. Para isso, não precisamos de soberba nem de nenhum outro poder: é necessária a humildade que é a virtude mais difícil de construir»[6].


Letizia Magri


[1] Mt 18, 15. [2] O número sete indica a totalidade, a plenitude: Deus cria o mundo em sete dias (cf. Gen 1,1-2,4). No Egito houve sete anos de abundância e sete de carestia (Gen 41, 29-30). [3] “Se Caim foi vingado sete vezes, Lamec sê-lo-á setenta vezes sete” (Gen 4,24). [4] C. Lubich, Palavra de Vida de outubro de 1981, in Parole di Vita, a/c Fabio Ciardi (Opere di Chiara Lubich 5) Città Nuova, Roma 2017, p. 219. [5] Cf. Oração do Pai Nosso, Mt 6,9-13. [6] Unità è il nome della pace: La strategia di Chiara Lubich, a/c Maddalena Maltese, Città Nuova, Roma, 2020, p.37.


(focolores)

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