Vaticano, 01 ago. 22 / 10:00 am (ACI).- O papa Francisco deu uma entrevista coletiva em italiano aos jornalistas que o acompanharam no voo de volta a Roma de sua viagem apostólica ao Canadá.
Abaixo, o texto integral da entrevista coletiva:
Matteo Bruni
A primeira pergunta desta noite é de Ka'Nhehsíio Deer, jornalista canadense de origem inuit.
-Jessica Ka'Nhehsíio Deer (CBC Rádio - Canadá Indigenous)
Como descendente de um sobrevivente de uma escola residencial, sei que os sobreviventes e suas famílias querem ver ações concretas após seus pedidos de desculpas, incluindo uma declaração sobre o fim da "Doutrina da descoberta". Nas Constituições nos Estados Unidos e no Canadá, os indígenas continuam sendo defraudados de suas terras e privados de poder sobre sua terra, por causa das bulas papais e da Doutrina da descoberta. Não pensa ter sido uma oportunidade perdida para fazer uma declaração nesse sentido durante sua viagem ao Canadá?
Não entendi a segunda parte da pergunta. Pode explicar o que entende por Doutrina da descoberta?
Jessica Ka'Nhehsíio Deer
Quando falo com os indígenas, eles dizem que quando os colonos vieram para tomar suas terras, eles se referiram a esta doutrina que estabelecia que eles eram inferiores aos católicos. Foi assim que os EUA e o Canadá se tornaram países ...
Obrigado pela pergunta. Creio que este é um problema de todo colonialismo, de todos eles. Ainda hoje: as colonizações ideológicas de hoje têm o mesmo esquema. Quem não entra em seu caminho, é inferior. Mas eu quero ir mais longe, sobre isso. Eram considerados não apenas inferiores: alguns teólogos ligeiramente loucos se perguntavam se tinham uma alma. Quando João Paulo II foi à África, para a porta onde os escravos embarcavam (Ilha Gorée, a porta sem retorno), ele fez um sinal para que pudéssemos entender o drama, o drama criminoso: aquelas pessoas eram jogadas no navio, em condições desastrosas, e depois se tornavam escravas na América. É verdade que havia vozes que falavam claro, como Bartolomeo de las Casas, por exemplo, Pedro Claver, mas eram a minoria. A consciência da igualdade humana veio lentamente. E digo consciência, porque no inconsciente ainda há algo ... Sempre, nós temos - permito-me dizer - como uma atitude colonialista de reduzir sua cultura à nossa. É algo que vem de nosso modo de vida desenvolvido, o nosso, que às vezes perdemos os valores que eles têm. Por exemplo: os povos indígenas têm um grande valor que é o valor da harmonia com a Criação e pelo menos alguns que eu conheço o expressam na palavra “viver bem”, que não significa, como entendemos os ocidentais, viver bem ou viver a dolce vita. Não. Viver bem é custodiar a harmonia. E isso para mim é o grande valor dos povos originais: a harmonia. Estamos acostumados a reduzir tudo à cabeça: em vez disso, a personalidade dos povos originais - estou falando em geral - sabe se expressar em três línguas: a da cabeça, a do coração e a das mãos. Mas todos juntos e eles sabem como ter esta linguagem com a Criação. Então, este progresso acelerado do desenvolvimento, exagerado, neurótico que temos... Não estou falando contra o desenvolvimento: o desenvolvimento é bom. Mas não é boa aquela ansiedade que temos: desenvolvimento-desenvolvimento-desenvolvimento... Veja, uma das coisas que nossa sociedade perdeu foi a capacidade de poesia.
Os povos indígenas têm essa capacidade poética. Não estou idealizando. Então, esta doutrina da colonização: é verdade, é ruim, é injusta e é usada também hoje. A mesma coisa. Talvez com luvas de seda, mas é usada, hoje em dia. Por exemplo, alguns bispos de alguns países me disseram: Mas, nosso país, quando pede crédito a uma organização internacional, eles lhe impõem condições, mesmo condições legislativas, colonialistas. Para lhe dar crédito, eles fazem você mudar um pouco seu modo de vida. Voltando à nossa colonização da América, a dos ingleses, dos franceses, dos espanhóis, dos portugueses, sempre houve esse perigo, de fato, essa mentalidade: somos superiores e esses povos indígenas não contam, e isso é grave. É por isso que temos que trabalhar no que você diz: voltar e curar, digamos, o que foi feito de errado, sabendo que o mesmo colonialismo existe hoje. Pense, por exemplo, em um caso, que é universal e eu ouso dizê-lo. Estou pensando no caso do Rohingya, em Mianmar: eles não têm direito à cidadania, são considerados de um nível inferior. Ainda hoje.
-Brittany Hobson, (THE CANADIAN PRESS)
O senhor fala frequentemente da necessidade de falar com clareza, honestidade e com parresia. O senhor sabe que a Comissão canadense para a verdade e a reconciliação descreveu o sistema das escolas residenciais como um "genocídio cultural" e depois foi modificado como genocídio. Aqueles que ouviram seu pedido de perdão nos últimos dias expressaram seu desapontamento pelo fato de a palavra genocídio não ter sido usada. O senhor usaria estas palavras para dizer que membros da Igreja participaram de um genocídio?
É verdade, não usei a palavra porque não me veio em mente, mas descrevi o genocídio e pedi perdão, perdão, por este “trabalho” que é genocida. Por exemplo, condenei isto também: tirar as crianças, mudar a cultura, mudar as mentes, mudar as tradições, mudar uma raça - digamos - uma cultura inteira. Sim, é uma palavra técnica genocídio, eu não a usei porque não me veio em mente, mas eu descrevi... é verdade, sim, é um genocídio. Não se preocupe, você pode relatar que eu disse que foi genocídio.
-Valentina Alazraki (TELEVISA)
Papa Francisco, suponhamos que esta viagem ao Canadá também foi um teste, uma prova, para sua saúde, para o que o senhor chamou de "limitações físicas" esta manhã. Por isso gostaríamos de saber, depois desta semana, o que pode nos dizer sobre suas futuras viagens: se quer continuar viajando assim, se haverá viagens que não pode fazer por causa dessas limitações, ou se pensa que a operação no joelho poderia resolver mais a situação e (voltar a) viajar como antes.
Não sei, acho que não posso ir no mesmo ritmo das viagens de antes. Penso que na minha idade e com esta limitação tenho que economizar um pouco para poder servir à Igreja. Ademais, pelo contrário, posso pensar na possibilidade de colocar-me de lado, isto, com toda honestidade, não é uma catástrofe, se pode mudar o Papa, se pode mudar, sem problemas. Mas eu acho que tenho que me limitar um pouco com estes esforços. A cirurgia do joelho não se terá, no meu caso. Os técnicos dizem que sim, mas há todo o problema da anestesia, eu passei por mais de seis horas de anestesia há dez meses e ainda há vestígios. Não se brinca com anestesia. É por isso que se pensa que não é totalmente conveniente. Tentarei continuar viajando e estar perto das pessoas porque acredito que seja uma forma de servir: a proximidade. Mas mais do que isso eu não posso dizer, espero.... No México ainda não há previsão, eh?
Valentina Alazraki
Não, não, eu sei disso, mas existe o Cazaquistão, e se vai ao Cazaquistão não deveria ir também à Ucrânia?
Eu disse que gostaria de ir à Ucrânia. Vamos ver agora o que eu encontro quando chego em casa. No Cazaquistão no momento eu gostaria de ir, é uma viagem tranquila, sem muito movimento, é um congresso de religiões. Por enquanto, tudo permanece. Também tenho que ir ao Sudão do Sul antes do Congo, porque é uma viagem com o arcebispo de Cantuária e o bispo da Igreja da Escócia, porque nós fizemos todos os três um retiro, juntos, há dois anos... E depois ao Congo, mas isso será no próximo ano, porque há a estação das chuvas, vejamos... Eu tenho toda a boa vontade, mas vamos ver o que diz a perna.
-Carolina Pigozzi (PARIS MATCH)
Esta manhã o senhor se encontrou no arcebispado com membros locais da Companhia de Jesus, a sua família; como sempre faz durante suas viagens. Nove anos atrás, retornando do Brasil, perguntei-lhe se ainda se sentia jesuíta. Sua resposta foi positiva. Em 4 de dezembro passado, depois de ver os jesuítas na Grécia, o senhor disse que quando se inicia um processo é preciso deixá-lo se desenvolver, deixar crescer uma obra e depois é preciso retirar-se. Todo jesuíta - disse o senhor - deve fazer isto, nenhuma obra lhe pertence porque pertence ao Senhor. Esta declaração poderia um dia ser válida para um Papa jesuíta?
Creio que sim...sim.
Carolina Pigozzi
Quer dizer que o senhor poderia se retirar como os jesuítas?
Sim. Sim. É uma vocação.
Carolina Pigozzi
Ser Papa ou jesuíta?
Jesuíta. Que o Senhor diga. O jesuíta busca - busca, nem sempre o faz, mas busca - fazer a vontade do Senhor. O Papa jesuíta também deve fazer o mesmo. Quando o Senhor fala..., se o Senhor lhe diz: vá em frente, você vai em frente, se o Senhor lhe diz: vá para o canto, você vai para o canto. É o Senhor quem...
Carolina Pigozzi
O que o senhor diz significa que espera a morte a este ponto....
Mas todos nós esperamos pela morte...
Carolina Pigozzi
Quero dizer: não se retira antes?
O que o Senhor diz. O Senhor pode dizer renuncie. É o Senhor quem comanda.
Uma coisa sobre Santo Inácio, isto é importante. Santo Inácio, quando alguém estava cansado, doente, o dispensava da oração, mas jamais o dispensava do exame de consciência. Duas vezes ao dia: ver o que aconteceu no meu coração hoje. Não pecados ou não pecados, mas que espírito me moveu hoje. Nossa vocação é procurar o que aconteceu hoje. Se eu - esta é uma hipótese - vejo que o Senhor está me dizendo algo, que algo me aconteceu, que eu tenho uma inspiração, devo discernir para ver o que o Senhor está pedindo. Também pode ser que o Senhor queira me mandar para um canto, é Ele quem comanda. Este é o modo de vida religioso de um jesuíta, estar em discernimento espiritual para tomar decisões, escolher um caminho de trabalho, de compromisso também... O discernimento é a chave na vocação do jesuíta. Isto é importante. Santo Inácio foi muito bom nisso porque foi sua própria experiência de discernimento espiritual que o levou à conversão. E os exercícios espirituais são realmente uma escola de discernimento. Portanto, o jesuíta deve ser por vocação um homem de discernimento: discernir situações, discernir a própria consciência, discernir as decisões a serem tomadas. É por isso que ele deve estar aberto a tudo o que o Senhor lhe pedir, esta é um pouco a nossa espiritualidade.
Carolina Pigozzi
Mas o senhor se sente mais Papa ou mais jesuíta?
Bem... Nunca fiz essa medição, (nunca) medi (se) mais Papa ou jesuíta. Eu me sinto um servo do Senhor com o hábito do ser jesuíta. Não há uma espiritualidade papal. Não há. Cada Papa leva adiante sua própria espiritualidade. Pense em São João Paulo II com aquela bela espiritualidade mariana que ele tinha. Ele a tinha antes e a tinha como Papa. Pense nos muitos Papas que levaram adiante sua espiritualidade.
O papado não é uma espiritualidade, é um trabalho, uma função, um serviço. Cada um o realiza com sua própria espiritualidade, suas próprias graças, sua própria fidelidade e também seus próprios pecados. Mas não há uma espiritualidade papal. É por isso que não há confronto entre a espiritualidade jesuíta e a espiritualidade papal, porque esta última não existe. Entendeu?
-Severina Elisabeth Bartonitschek (CIC)
Ontem o senhor falou também sobre a fraternidade na Igreja, uma comunidade que sabe ouvir e entrar em diálogo, que promove uma boa qualidade de relacionamento. Mas, há poucos dias, a Santa Sé fez uma declaração sobre o Caminho Sinodal na Alemanha, (um texto) sem assinatura. O senhor acha que este modo de se comunicar pode contribuir ou é um obstáculo para o diálogo?
Em primeiro lugar, este comunicado foi feito pela Secretaria de Estado... foi um erro não dizer isso... creio que se dissesse declaração da Secretaria de Estado, mas não tenho certeza. Foi um erro não ter assinado como Secretaria de Estado; mas um erro de ofício, não de má vontade. Sobre o Caminho sinodal escrevi uma carta, a fiz sozinho, após um mês de oração, reflexão e consultas. Eu disse tudo o que tinha que dizer sobre o Caminho sinodal, mais do que isso não direi: este é o Magistério papal sobre o Caminho sinodal. Escrevi esta carta há dois anos. Passei por cima da Cúria, porque não a consultei. Fiz por minha iniciativa, como pastor, como irmão, como pai e como cristão para uma Igreja que está à busca de um caminho. Esta é a minha mensagem. Sei que não é fácil, mas tudo está escrito nesta carta. Obrigado.
-Ignazio Ingrao (RAI - TG1)
A Itália está passando por um momento difícil, que causa preocupação também em nível internacional. Além da crise econômica, da pandemia, da guerra, agora também estamos sem governo. Como Primaz da Itália, o senhor enviou um telegrama ao Presidente Mattarella pelo seu aniversário, no qual falou de um país marcado por não poucas dificuldades e chamado a fazer escolhas cruciais. Como o senhor vivenciou a queda de Draghi?
Em primeiro lugar, não quero me envolver na política interna italiana. Depois, ninguém pode dizer que o Presidente Draghi não é um homem de alta qualidade internacional: foi presidente do Banco (Central Europeu) e teve uma boa carreira profissional. Fiz apenas uma pergunta a um dos meus colaboradores: Quantos governos a Itália teve neste século? E me respondeu: 20. Esta é a minha resposta...
Ignazio Ingrao
Qual o apelo que o senhor faz às forças políticas em vista das próximas difíceis eleições?
Responsabilidade. Responsabilidade cívica....
-Claire Giangrave (RELIGION NEWS SERVICE)
Muitos católicos, mas também muitos teólogos, acham que há necessidade de certa abertura da Doutrina da Igreja, no que se refere aos anticoncepcionais. Parece que até seu predecessor, João Paulo I, pensava que uma proibição total precisaria ser revista. O que o senhor acha: estaria disponível a fazer uma reavaliação sobre isto ou há uma possibilidade de um casal levar em consideração os anticoncepcionais?
Esta é uma questão precisa. Mas, saiba que o dogma e a moral são sempre um caminho em desenvolvimento, em desenvolvimento no mesmo sentido. Para ser mais claro, repito o que já disse aqui outras vezes: para o desenvolvimento teológico de uma questão moral ou dogmática, há uma regra que é muito clara e iluminadora. Foi o que disse São Vicente de Lérins, no século X, mais ou menos: “A verdadeira doutrina, para ir adiante e se desenvolver, não deve ficar calada, mas fazer progresso: “ut annis consolidetur, dilatetur tempore, sublimetur aetate”, ou seja, deve ser consolidada com o passar do tempo, ampliada, concretizada e mais sólida, mas sempre em contínuo progresso. Por isso, o dever dos teólogos é pesquisar, fazer uma reflexão teológica; não se pode aplicar a teologia diante de um "não". Depois, cabe ao Magistério dizer “não, você exagerou, reveja seu ponto de vista”. O desenvolvimento teológico deve ser aberto, por isso existem os teólogos, e o Magistério deve ajudar a compreender os limites. A respeito dos anticoncepcionais, sei que foi feita uma publicação sobre este tema e sobre questões matrimoniais. Estes temas são tratados pelos participantes em um congresso, onde discutem e fazem propostas. Sejamos sinceros: os que participaram deste congresso cumpriram o seu dever, porque tentaram dar um passo adiante na doutrina, mas em sentido eclesial, não fora da Igreja, como eu disse sobre a regra de São Vicente de Lérins. Depois, o Magistério poderá intervir e dizer “sim, é bom ou não é bom”. Assim acontece com tantas outras coisas. Pense, por exemplo, na questão das armas atômicas: declarei, oficialmente, que o uso e a posse de armas atômicas são imorais; pense na pena de morte: hoje, podemos dizer, que estamos próximos à imoralidade, porque a consciência moral se desenvolveu bem. Para ser mais claro: quando o dogma ou a moral se desenvolvem, tudo bem, mas sempre naquela direção, segundo as três regras de São Vicente de Lerins. Parece que isto está bem claro: uma Igreja que não desenvolve seu pensamento no sentido eclesial é uma Igreja que retrocede. Eis o problema de hoje, de muitos que se dizem tradicionais. Não, não são tradicionais, são "antiquados", vão para trás, sem raízes. Sempre aconteceu assim, como no século passado. O "retrocesso” é um pecado, porque não caminha adiante com a Igreja. Ao invés, alguém disse que a tradição - acho que tratei disso em algum discurso – a tradição é “a fé viva dos mortos”; enquanto esses "retrógrados", que se dizem tradicionalistas, afirmam que a tradição é “a fé morta dos vivos”. A tradição é, exatamente, a raiz, a inspiração para progredir na Igreja, sempre de modo vertical. O "atraso" significa retroceder, permanecer fechados. É importante entender bem o papel da tradição: ela está sempre aberta; é como a seiva das raízes que faz uma árvore crescer... O compositor, Gustav Mahler, disse uma frase muito bonita: “A tradição, neste sentido, é a garantia do futuro, não uma peça de museu. Quem concebe a tradição como uma coisa fechada, é contrário à tradição cristã... a tradição é como a seiva das raízes que faz crescer sempre mais e mais”. Por isso, em relação à sua questão, é preciso pensar e manter a fé e a moral, mas sempre como a seiva das raízes e como as três regras de São Vicente de Lerins, que mencionei.
-Eva Fernandez (Cadena Cope)
No fim de agosto, haverá um Consistório. Ultimamente, muitos perguntam se o senhor pensa em renunciar, não se preocupe, desta vez não lhe perguntaremos isso, mas somos curiosos: já pensou alguma vez quais características gostaria que seu sucessor tivesse?
“Sabe, isso cabe ao Espírito Santo. Eu jamais ousaria pensar nisso... O Espírito Santo sabe o que deve fazer, melhor do que eu e de todos nós. Ele inspira as decisões do Papa, sempre. Ele está vivo na Igreja: não se pode conceber uma Igreja sem o Espírito Santo; é Ele que faz a diferença, mas também barulho, como na manhã de Pentecostes e, depois, traz harmonia. É importante falar de "harmonia" mais que de "unidade". Unidade sim, mas, sobretudo, harmonia, não como uma coisa estática. O Espírito Santo proporciona uma harmonia progressiva, contínua. Gosto do que São Basílio diz sobre o Espírito Santo: “Ipse harmonia est”, Ele é harmonia! É harmonia porque, antes faz barulho, com os diferentes carismas. Mas, vamos deixar esta obra ao Espírito Santo. A respeito de uma minha eventual demissão, gostaria de agradecer um lindo artigo, que vocês escreveram, destacando todos os sinais que poderiam levar a uma demissão ou que podem causar uma decisão deste tipo. Foi um bom trabalho do jornalista que escreveu o artigo, que no final deu a sua opinião. Ele pondera todos os sinais, não só as declarações, com uma linguagem sutil, que, porém, também demonstra seus sinais: saber ler os sinais dos tempos ou, pelo menos, fazer um esforço para interpretá-los. Este é um bom trabalho pelo qual agradeço a todos”.
-Phoebe Natanson (ABC NEWS)
Desculpe, Santo Padre, sei que muitos já fizeram perguntas deste tipo. Mas, eu gostaria de saber se, neste período, com as dificuldades da saúde e tudo, já lhe aconteceu vir à mente a ideia de que pode ser a hora de se aposentar? Algum momento difícil o levou a pensar nisso?
A porta está aberta! Trata-se de uma escolha normal. Mas, até hoje, ainda não bati a esta porta, para passar para outra sala. Nunca pensei nesta possibilidade.
Porém, isso não significa que eu não possa começar a pensar nisso depois de amanhã, não? Todavia, sinceramente, neste momento não penso. Esta minha viagem foi uma espécie de teste... Claro, não se pode viajar neste estado. Talvez seja preciso mudar um pouco o modo, diminuir um pouco as atividades, pagar as dívidas das viagens, que ainda não foram feitas, reorganizar... Contudo, caberá ao Senhor dizer o que devo fazer. A porta está aberta, é verdade.
Agora, antes de me despedir de vocês, queria falar uma coisa, que é muito importante para mim: a minha viagem ao Canadá foi muito relacionada à figura de Santa Ana. Falei algumas coisas sobre as mulheres, mas, sobretudo, sobre os idosos, as mães e as avós. Mas, deixei claro que “a fé deve ser transmitida em dialeto e o dialeto, um dialeto maternal, o usado pela avós.
Nós recebemos a fé da forma dialetal feminina; é muito importante o papel das mulheres na transmissão da fé e no desenvolvimento da fé. Foram nossas mães ou avós que nos ensinaram a rezar; foram elas que nos transmitiram as primeiras noções sobre a fé, que uma criança não entende. Por isso, digo que esta transmissão dialetal da fé é feminina. Alguém poderia replicar: mas, teologicamente, como se pode explicar isso? Eu poderia responder dizendo que “quem transmite a fé é a Igreja e a Igreja é mulher, é esposa, não é masculina... a Igreja é mulher. Devemos entrar nesta ótica de pensamento de uma Igreja mulher, uma Igreja mãe, mais importante do que qualquer fantasia ministerial machista ou dominada por qualquer poder machista. A Igreja é materna. Eis a maternidade da Igreja, segundo a figura da Mãe do Senhor. Por isso, é importante ressaltar a importância do dialeto materno na transmissão da fé.
Descobri isso, por exemplo, ao ler o martírio dos irmãos Macabeus: por duas ou três vezes, dizem que sua mãe lhes dava coragem com o dialeto materno. Logo, a fé deve ser transmitida em dialeto, um dialeto falado pelas mulheres. Eis a grande alegria da Igreja, porque a Igreja é mulher, a Igreja é esposa. Quis deixar claro isso pensando em Santa Ana. Obrigado, pela paciência de vocês. Obrigado pela atenção. Descansem e boa viagem.
Por fim, o Papa retomou o microfone para cumprimentar Paolo Rodari, vaticanista do jornal italiano “La Reppublica”, em seu último voo papal.
(acidigital)
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