quarta-feira, 2 de julho de 2014

Já vieste para o verão?


Já vieste para o verão? É a pergunta sagrada que os meus patrícios me fazem.
Já cheguei, com uma viagem mexida entre São Miguel e Terceira, que o mar mesmo no verão não é de brincadeiras. No grupo central, a proteção das ondas faz-se por cada uma das ilhas, em canais mais ou menos longos que, não fosse o encantamento do mar e das tonalidades que o fim do dia nos oferecem, e não haveria nenhum avião que encurtasse as distâncias de horas.
Só numa viagem de barco nos apercebemos do que é, verdadeiramente, um arquipélago. Viver em ilhas significa sempre demoras, tempo perdido ou ganho, consoante a perspetiva de análise.
Viver em ilhas é construir diferenças, histórias e culturas expressas não só nos diferentes falares, como nos hábitos e costumes que nos enriquecem.
E Ninguém diga que conhece as nove ilhas, porque conhecer uma ilha, um concelho ou uma localidade, é muito mais do que ter um amigo aqui ou ali, assistir a uma festa mais ou menos importante, conhecer as mais belas paisagens e vistas...
Conhecer uma ilha ou uma localidade, é conhecer a alma das gentes, é comer caldo de couves com carne de porco ou o peixe frito inhames ou batatas-doces apanhado sobre o pesqueiro mais próximo; é sentar-se junto à banqueta coversando e ouvindo estórias contadas mil e uma vezes pelos homens mais idosos; é ouvir a banda de música na festa do padroeiro e os comentários de antigos tocadores sobre como era antigamente; é conversar com os jovens e ouvir as suas aspirações sobre um futuro incerto; é cheirar os incensos em Março, ou as uvas e as maçãs no verão... É ver com os olhos da inteligência as festas do Espírito Santo saboreando as sopas e o vinho de cheiro, o pão de massa sovada, acompanhada de manteiga e queijo, numa ceia à moda dos mais antigos.
Conhecer uma ilha é perceber e entender as conversas com um sotaque típico da Terceira ou de São Jorge, das Flores ou do Faial, e mais: é aceitar que na freguesia ao lado, uma expressão popular pode dizer-se de outro modo, sem nunca desrespeitar a lingua portuguesa.
O Arquipélago, como uma nação, é uma riqueza incomensurável e sempre renovada, é um manancial de conteúdos culturais tão eloquentes que só aturadas investigações conseguem desvendar.
Neste arquipélago central, em que as festas são todas iguais e todas diferentes quanto o são as pessoas que nele habitam, o verão traz a alegria do reencontro.
É isso que faz a diferença.
É por isso que cada vez mais gente nos procura, não só para conhecer a paisagem natural, mas para perceber também a paisagem humana que envolve estas ilhas.

José Gabriel Ávila (facebook)
Lajes do Pico, Dia de São Pedro 2014.

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