sexta-feira, 20 de maio de 2016

A verdade acerca do mercado das armas


Numa série televisiva anglo-americana

Quando nos jornais e na televisão os analistas procuram explicar ao vasto público as razões que estão por detrás do desastre no Médio Oriente e na África – e por conseguinte as causas que levam tantos seres humanos a emigrar daquelas terras não importa como, aterrorizados e privados de tudo, até pondo em risco a própria vida – referem-se sempre à política. O Is e outros grupos fundamentalistas são os principais acusados, algumas vezes as análises chegam corajosamente a examinar a vontade de controle no cenário internacional das grandes potências, e tudo acaba ali.

Ao contrário, o Papa Francisco não se limita a estas análises e fala sempre de comércio de armas, de mercantes de morte. Mas normalmente as suas palavras caem no vazio, como se fosse uma sua extravagância, uma sua ideia fixa de pessoa «não perita na questão» e, por conseguinte, no fundo não muito informada. Mas ao contrário, ele é o único que diz a verdade. Disto encontramos uma confirmação onde menos esperávamos: numa série televisiva.

Acabou de se concluir na Itália a transmissão de uma lindíssima produção anglo-americana, The Night Manager, baseado num romance de John le Carré, que começa e termina no Cairo, mas que se desenrola também na Inglaterra, Espanha, Turquia e naturalmente nos Estados Unidos. Sem dúvida, há o herói bom e corajoso que sozinho desafia os malvados até contra a vontade dos serviços secretos corruptos, e a agente da contra-espionagem que o apoia não obstante as intimidações, mesmo estando grávida, como nos mais afirmados plot. Além disso, a representação perfeita de lugares e personagens, e a coragem de tratar temas contemporâneos: de facto a série começa com a queda de Mubarak.

Mas a verdadeira novidade é que no centro de tudo está o comércio das armas guiado em larga escala, com o tácito consenso dos governos que é obtido através da corrupção. Os elevados lucros acumulados por estes mercantes servem de facto para obter conivências em toda a parte, a fim de evitar qualquer tipo de controle.

Os protagonistas deste comércio são homens de negócios aparentemente respeitáveis, riquíssimos, em estreitas relações com elites internacionais. Extremamente poderosos e interessados, além de qualquer razão política, a prolongar os conflitos o mais possível. O ponto saliente da narração é quando os protagonistas se encontram no Refúgio, uma espécie de enorme acampamento na fronteira entre a Turquia e a Síria onde são conservadas as armas, para depois as fazer passar através do confim mascaradas de ajudas humanitárias.

Mas neste lugar há também um pequeno exército de mercenários, de regresso de várias guerras, que não só estão prontos para adestrar combatentes de todas as frentes, mas também a engajar-se em ações miradas. A pagamento, claro. E sempre a fim de fazer reacender o conflito se por acaso estiver a diminuir, se se aproximar a possibilidade de paz. Em paralelo, acampamentos de refugiados desesperados, a visão de corpos dilacerados por aquelas armas perfeitas e precisamente por isto cada vez mais nocivas, até porque, dado que escapam a qualquer controle, com frequência são armas proibidas pelos tratados internacionais, como as bombas-cacho.

É curioso que uma só série televisiva mostre aquilo que ninguém, exceto o Papa Francisco, denuncia: ou seja, que existe uma lobby de mercantes de morte, poderosíssima porque riquíssima, que está interessada única e exclusivamente em fomentar conflitos e no seu prolongamento no tempo. Isto é, alimentar aquela «guerra mundial aos bocados» que talvez já tenha escapado a qualquer controle.


Lucetta Scaraf

(osservatoreromano.va)


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