Terrorismo marcou os últimos dias da campanha eleitoral.
Conservadores procuram cimentar a maioria na Câmara dos Comuns enquanto
Trabalhistas ainda acreditam na vitória.
Na manhã de 18 abril, Theresa
May surpreendeu o Reino Unido e a Europa, em frente ao número 10 de Downing
Street, ao convocar
eleições gerais antecipadas. Confortável com as sondagens que davam
uma esmagadora vitória ao seu Partido Conservador (Tory), a primeira-ministra
britânica, que sucedeu a David Cameron, tomou a decisão com o objetivo de
reforçar, nas urnas, a sua posição para o difícil processo negocial com a União
Europeia relativamente ao Brexit.
No entanto, muita coisa mudou desde
então e a vitória dada como adquirida está longe de o ser, muito devido à
ascensão do Partido Trabalhista (Labour), liderado por Jeremy Corbyn.
Se em abril a diferença nas sondagens entre os dois maiores partidos do Reino
Unido era de mais de 20 pontos percentuais, hoje estão lado a lado, sendo prematuro atribuir a
vitória a qualquer um dos dois.
Theresa May partiu para a campanha em clara vantagem, uma vez
que, em abril, se pensava que o Brexit iria dominar todo o período eleitoral. A
primeira-ministra britânica procurava unir o Reino Unido em torno desta
temática, o que parecia beneficiá-la relativamente a Jeremy Corbyn, que durante
a campanha do Brexit não conseguiu assumir uma posição consistente. Hoje, ambos parecem
decididos relativamente à saída do Reino Unido do projeto europeu.
Contudo, o programa eleitoral dos dois partidos é completamente
oposto. Theresa May
aposta num ‘hard Brexit’, em limitar o mercado único e a entrada de imigrantes no país,
ao mesmo tempo que promete um aumento do ordenado mínimo. Por seu lado, Corbyn
prefere um Brexit mais ‘soft’ e um maior peso do Estado na economia britânica -
defende a nacionalização de setores como a água, eletricidade e correios,
bem como um reforço do serviço nacional de saúde.
Mas, nas últimas duas semanas, muita coisa mudou. A campanha
eleitoral foi suspensa por duas vezes e a reta final do
processo está a ser marcada pela segurança.
Terrorismo no centro da campanha
O Reino Unido ficou em choque na noite de 22 de maio, quando Salman
Abedi se fez explodir à entrada da Manchester Arena, onde
acabava de terminar o concerto de Ariana Grande, com um público
maioritariamente juvenil. Morreram 22 pessoas
e 59 ficaram feridas.
Duas semanas depois, o terror regressou, desta vez a Londres. Khuram Buut, Rachid
Redouane e Youssef Zaghba atropelaram
a multidão que passava na London Bridge e dirigiram-se depois para o Borough
Market, onde esfaquearam várias pessoas antes de serem abatidos pela polícia.
Oito pessoas morreram e 48 ficaram feridas.
Estes dois ataques relegaram o Brexit e a situação económica e
social do país para segundo plano, acentuando-se o tom de acusação entre os
Tories e o Labour. Jeremy Corbyn chegou
mesmo a exigir a demissão de Theresa May, responsabilizando-a por
ter cortado 20 mil polícias dos quadros. Já a primeira-ministra, que sempre
acusou o seu principal rival de radicalismo, endureceu o
discurso e afirmou que estaria disposta a mudar a lei para combater o
terrorismo, mesmo que isso implicasse passar por cima dos Direitos Humanos.
Entre as propostas da primeira-ministra está o aumento das
sentenças de prisão para pessoas condenadas por terrorismo, a deportação de
presumíveis terroristas ou a restrição nos seus movimentos. “Se os Direitos Humanos
nos impedirem de o fazer, vamos mudar as leis para o que possamos fazer”, reiterou Theresa May, citada
pelo The Guardian.
A grande questão que se coloca é perceber qual dos dois
discursos vai conseguir obter a confiança do eleitorado, confuso com algumas
contradições. Se por um
lado Jeremy Corbyn critica May por esta ter feito cortes nas forças policiais,
por outro o seu discurso está longe de estar centrado num endurecimento da
retórica do aumento do policiamento nas ruas como forma de resolver a questão
do terrorismo. Já Theresa May estabelece como prioridade o aumento da
segurança, o que não a impediu de baixar o nível de ameaça terrorista no Reino
Unido.
Eleições mais
"desconcertantes de sempre"
No início da
campanha eleitoral, era expectável que os Tories reforçassem a sua maioria na
Câmara dos Comuns, onde estão em jogo 650 assentos. Apesar de não
ser impossível, parece pouco provável que consigam ultrapassar os 330 lugares
que têm atualmente.
A última sondagem divulgada pelo The Telegraph dá a vitória aos
Tories, com 42,9%. O Labour teria 37,2%. Contudo, as sondagens têm variado
bastante, com algumas a atribuírem a vitória aos conservadores com uma
diferença de 12 pontos percentuais relativamente aos trabalhistas, enquanto
outras situam a distância entre os dois partidos em apenas 1 ponto
percentual.
Neste cenário de incerteza, a campanha eleitoral não segue um
“caminho definido”. Anne Perkins, colunista no The Guardian, escreve que a
campanha de 2017 é “certamente a
mais desconcertante de sempre”.
Se recuarmos até às últimas eleições, em 2015, ou ao referendo
sobre o Brexit, em 2016, esta imprevisibilidade é acentuada pelo facto de em
ambas as situações as sondagens terem falhado. Além disso, o cenário
político britânico mudou bastante e são ainda incertos os lugares que os
restantes partidos vão conseguir obter na Câmara dos Comuns.
Os Liberais Democratas, que fizeram parte do governo de David
Cameron e chegaram a ser o terceiro maior partido do país, tiveram uma enorme
derrota em 2015, passando de 57 lugares para oito. Procuram agora recuperar da
desastrosa derrota. Por seu lado, o UKIP parece
estar a tornar-se cada vez mais irrelevante. Depois da vitória do Brexit, Nigel
Farage abandonou o partido por considerar que a “missão estava cumprida”. O atual líder, Paul Nuttall,
parece um pouco à deriva, sem discurso, incapaz de mobilizar eleitorado.
É também importante ter em conta o papel que Escócia, País de
Gales, Irlanda e Irlanda do Norte assumem no processo eleitoral. Particularmente relevante
é o caso do Partido Nacional Escocês, liderado pela primeira-ministra escocesa,
Nicola Sturgeon, que tem sido uma forte opositora de May na forma de
conduziu o processo do Brexit. Atualmente, tem 56 assentos.
Já no caso irlandês, convém realçar o Sinn Féin, atualmente com
quatro lugares na Câmara, que defende uma Irlanda unida e pede um referendo
sobre a fronteira da Irlanda do Norte.
O Reino Unido, assustado com o terrorismo e indeciso sobre o
futuro das negociações com a Europa e a economia nacional, decide hoje o seu
futuro. Ao que tudo indica, os Tories
deverão conseguir a vitória. Resta saber se vão conseguir uma maioria ou se,
por outro lado, uma vitória surpresa do Labour vai agitar (ainda mais) a
política britânica. Até porque, nos últimos tempos, as surpresas têm sido muitas.
(noticiasaominuto)
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