sábado, 16 de dezembro de 2017

Ter em consideração as pequenas coisas

Missa em Santa Marta


Precisamente como uma mãe e como um pai, que se faz chamar ternamente com um termo carinhoso, Deus está ali a entoar ao homem a canção de embalar, talvez imitando a voz de criança para ter a certeza de ser compreendido e sem medo de se tornar até «ridículo», porque o segredo do seu amor é «o grande que se faz pequeno». Este testemunho de paternidade — de um Deus que pede a cada um que lhe mostre as suas chagas para as poder curar, exatamente como faz o pai com o filho — foi relançada pelo Papa Francisco na missa celebrada a 14 de dezembro em Santa Marta.
Inspirando-se na primeira leitura, tirada «do livro da consolação de Israel, do profeta Isaías» (41, 13-20), o Pontífice observou que ela salienta «uma caraterística do nosso Deus, um aspeto que é a definição própria dele: a ternura». De resto, acrescentou, «já o dissemos» também no salmo 144: «A sua ternura difunde-se sobre todas as criaturas».
«Este trecho de Isaías — explicou — começa com a apresentação de Deus: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te pego pela mão e te digo: nada temas, Eu venho em teu auxílio?”». Mas «uma das primeiras coisas que impressiona deste texto» é o modo como Deus «diz isto a ti»: «Nada temas, pequeno verme de Jacob, larva de Israel». Em síntese, afirmou, Deus «fala como o pai ao filho». E no entanto, observou, «quando o pai quer falar ao filho, abaixa a voz e até procura torná-la mais semelhante à da criança». E ainda, «quando o pai fala com o filho parece ser ridículo, porque se faz criança: esta é a ternura».
Por isso, prosseguiu, «Deus fala-nos assim, acaricia-nos assim: “Nada temas pequeno verme, larva”». A tal ponto que «parece que o nosso Deus quer entoar-nos uma canção de embalar». E, garantiu, «o nosso Deus é capaz disto, a sua ternura é assim: é pai e mãe».
De resto, afirmou Francisco, «disse muitas vezes: “Se uma mãe se esquece do filho, Eu não me esqueço de ti”. Leva-nos nas suas entranhas». Portanto, «é o Deus que, com este diálogo, se faz pequeno para que entendamos, confiemos nele e lhe digamos com a coragem de Paulo, que muda a palavra e diz: “Papá, aba, papá». Esta é a ternura de Deus».
Estamos perante, explicou, «um dos maiores mistérios, uma das coisas mais bonitas: o nosso Deus tem esta ternura que nos aproxima e nos salva». Sem dúvida, prosseguiu, «às vezes castiga-nos, mas acaricia-nos». É sempre «a ternura de Deus». E «Ele é o grande: “Nada temas, venho em teu auxílio, o teu redentor é o santo de Israel”». E assim «é o Deus grande que se faz pequeno e na pequenez não deixa de ser grande, e nesta dialética grande é pequeno: há a ternura de Deus, o grande que se faz pequeno, e o pequeno que é grande».
«O Natal ajuda-nos a entender isto: naquela manjedoura está o Deus pequeno», reiterou dizendo: «Vem à minha mente uma frase de S. Tomás, na primeira parte da Suma. Desejando explicar isto, “o que é divino, qual é a coisa mais divina?”, diz: Non coerceri a maximo contineri tamen a minimo divinum est», ou seja: o que é divino é ter ideais que não são limitados nem sequer pelo que existe de maior, mas ideais que sejam contidos e ao mesmo tempo vividos nas coisas mais pequeninas da vida. Em síntese, explicou, é um convite a «não se assustar com as coisas grandes, mas a ter em consideração as coisas pequenas: isto é divino, as duas juntas». E os jesuítas conhecem bem esta frase porque «ela foi usada para fazer uma das lápides de Santo Inácio, para descrever inclusive aquela força de Santo Inácio e também a sua ternura».
«Deus grande tem a força de tudo — afirmou o Papa referindo-se ainda ao trecho de Isaías — mas torna-se pequeno para se fazer próximo de nós e para nos ajudar, prometendo-nos certas coisas: “Farei de ti uma debulhadora; debulharás tudo. Alegrar-te-ás, gloriar-te-ás no Santo de Israel”». Eis «todas as promessas para nos ajudar a ir em frente: “O Senhor de Israel não te abandonará. Estou contigo”».
«Mas como é bom — exclamou — fazer esta contemplação da ternura de Deus! Quando queremos pensar não só no Deus grande, esquecendo-nos do mistério da Encarnação, da condescendência de Deus entre nós, da sua vinda ao nosso encontro: o Deus que não só é pai, mas é papá».
A este propósito, o Papa sugeriu algumas linhas de reflexão para um exame de consciência: «Sou capaz de falar com o Senhor assim, ou tenho medo? Cada um responda. Contudo, alguém pode dizer, perguntar: mas qual é o lugar teológico da ternura de Deus? Onde podemos encontrar bem a ternura de Deus? Qual é o lugar onde se manifesta melhor a ternura de Deus?». A resposta, observou Francisco, é «a chaga: as minhas e tuas feridas, quando a minha chaga se encontra com a tua. Fomos curados nas suas chagas».
«Gosto de pensar — confidenciou o Pontífice, repropondo o conteúdo da parábola do bom samaritano — no que aconteceu com aquele pobre homem que caiu nas mãos dos salteadores que ia de Jerusalém para Jericó, no que ocorreu quando ele estava na cama e retomou a consciência. Sem dúvida, perguntou ao hospedeiro: “Que aconteceu?”. Ele, pobre homem, narrou: “Foste espancado, perdeste a consciência” — “Mas por que estou aqui?” — “Porque veio alguém que lavou as tuas feridas. Cuidou de ti, trouxe-te aqui, pagou a pensão e disse que voltará para fazer as contas, se houver algo mais para pagar”».
Precisamente «este é o lugar teológico da ternura de Deus: as nossas chagas», afirmou o Papa. E, portanto, «o que nos pede o Senhor? “Mas vem cá: mostra-me a tua ferida, mostra-me as tuas chagas. Quero tocá-las, quero curá-las”». E é «ali, no encontro da nossa ferida com a chaga do Senhor que está o preço da nossa salvação, ali está a ternura de Deus».
Concluindo, Francisco sugeriu que pensemos em tudo isto «hoje, durante o dia, procurando ouvir este convite do Senhor: “Vem cá: mostra-me as tuas feridas. Eu quero curá-las”».

(osservatoreromano)

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