24 de Julho de 2018
Depois
de cinquenta anos da publicação, a encíclica Humanae vitae de Paulo VI
apresenta-se aos olhos dos homens de hoje de maneira completamente diferente:
em 1968 era um documento corajoso – e por conseguinte controverso – que ia
contra o pensar da época, o da revolução sexual, a qual para se realizar eram
fundamentais um anticoncepcional seguro e também a possibilidade de aborto. Era
o tempo no qual os economistas falavam de «bomba humana», isto é, do perigo de
superpopulação que ameaçava os países ricos e podia diminuir a sua
prosperidade.
Portanto,
duas forças poderosas uniram-se contra a encíclica: a utopia da felicidade, que
a revolução sexual prometia a cada ser humano, e a riqueza, que teria sido a
consequência lógica de uma diminuição da população em vasta escala.
Hoje,
depois de cinquenta anos, vemos tudo de outro modo. Estas duas visões utópicas
concretizaram-se, mas não deram os resultados esperados: nem a felicidade nem a
riqueza, mas ao contrário novos e dramáticos problemas. Se a diminuição da
população nos países avançados se está a confrontar com dificuldade com a
chegada em massa de imigrantes necessárias mas ao mesmo tempo inaceitáveis para
muitos, a partir do controle médico dos nascimentos teve início a invasão da
procriação por parte da ciência, com resultados ambíguos, com frequência
preocupantes e perigosos.
Hoje,
que estamos a pagar todos os custos de uma brusca e grande diminuição da taxa
de natalidade, que tantas mulheres depois de anos de anticoncepcionais químicos
já não conseguem conceber um filho, damo-nos conta de que a Igreja tinha razão,
que Paulo VI fora profético quando propôs uma regulamentação natural dos
nascimentos que teria preservado a saúde das mulheres, a relação dos casais e a
naturalidade da procriação. Hoje, que as jovens apaixonadas pela ecologia optam
por métodos naturais de regulamentação da fertilidade, sem nem sequer saberem
que existe a Humanae vitae, hoje, que os governos tentam realizar políticas que
favoreçam a natalidade, devemos reler a encíclica com outros olhos. E em vez de
a ver como a grande derrotada da Igreja diante da modernidade dominante,
podemos reivindicar a sua lucidez profética ao compreender os perigos ínsitos
nestas mudanças e felicitar-nos, nós católicos, que mais uma vez a Igreja não
tenha caído na cilada aliciante das utopias do século XX, mas tenha sabido
compreender imediatamente os seus limites e perigos.
Mas
poucos conseguem: para muitos é ainda difícil afastar-se da velha contraposição
entre progressistas e conservadores, no âmbito da qual a encíclica foi
destruída, sem que se compreendesse o seu espírito crítico e força inovadora.
Ainda agora, parece que ninguém se recorda que, pela primeira vez, um Papa
aceitou a regulamentação dos nascimentos e exortou os médicos a pesquisarem
métodos naturais eficazes.
Portanto,
é muito importante conseguir ver a Humanae vitae com olhos novos, olhos de
seres humanos que vivem no século XXI, já cientes da falência de tantas utopias
e teorias económicas que foram propostas como infalíveis. Só assim podemos
enfrentar os problemas da família de hoje, o novo papel das mulheres e as
difíceis relações entre ética e ciência, cujas raízes estão – mesmo se em
alguns aspetos inconscientemente – naquele texto do longínquo ano de 1968.
Lucetta
Scaraffia
(osservatoreromano)
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