Com a inserção temática na Liturgia do III Domingo do Tempo
Comum, a Palavra de Deus é evidenciada em modo celebrativo/comunitário em todo
o orbe cristão, com abertura e acolhimento às diversas igrejas, também as
provenientes da Reforma do Século XVI e com toda a Ortodoxia. Abre-se também ao
já percorrido caminho de Diálogo Hebraico – Cristão.
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
Em 26 de janeiro, III
Domingo do Tempo Comum, será celebrado o primeiro Domingo da Palavra de Deus,
instituído pelo Papa com a recente Carta Apostólica, na forma de Motu
Proprio, Aperuit illis: “É
bom que não venha jamais a faltar na vida do nosso povo esta relação decisiva
com a Palavra viva, que o Senhor nunca Se cansa de dirigir à sua Esposa, para
que esta possa crescer no amor e no testemunho da fé", escreveu Francisco,
que às 10 horas (horário italiano) presidirá a Santa Missa na Basílica de São
Pedro, com transmissão do Vatican News com comentários em português. Ao
final da Celebração Eucarística, o Santo Padre entregará uma particular edição
da Bíblia aos fiéis presentes.
Dom Cristiano Sousa OSB
Cam*, monge Beneditino da Congregação de
Camaldoli, nos propõe uma reflexão sobre esta iniciativa do Santo Padre:
O Domingo da Palavra de
Deus, instituído pelo Papa Francisco, em sua Carta Apostólica sob forma de MOTU
PROPRIO, APERUIT ILLIS,
de 30 de setembro de 2019, reassume todo um percurso de maturação que a Igreja
fez nos últimos séculos, tendo como expressão a Constituição Dogmática Dei
Verbum, do Concílio Vaticano II, publicado em 18 de novembro de 1965. Não
podemos esquecer a Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, ocorrido em Roma em
outubro de 2008, que frutificou na Exortação Apostólica pós sinodal Verbum
Domini, do Papa Bento XVI (30 de setembro de 2010).
Como bem sublinha o Papa
Francisco, ao concluir sua Carta Apostólica, “Possa o domingo dedicado à
Palavra fazer crescer no povo de Deus uma religiosa e assídua familiaridade com
as sagradas Escrituras, tal como ensinava o autor sagrado já nos tempos
antigos: ‘esta palavra «está muito perto de ti, na tua boca e no teu coração,
para a praticares’ (Dt 30, 14).”
A assídua
familiaridade com o Santa Palavra não é um acréscimo virtuoso imposto
à vida espiritual ou um comportamento a ser instalado com finalidade
sobrenatural. Mas é, antes de tudo e acima de tudo, a substância e a identidade
de cada cristã e de cada cristão.
Com a inserção temática
na Liturgia do III Domingo do Tempo Comum, a Palavra de Deus é evidenciada em
modo celebrativo/comunitário, em todo o orbe cristão, com
abertura e acolhimento às diversas igrejas, também as provenientes da Reforma
do Século XVI e com toda a Ortodoxia. Abre-se também ao já percorrido caminho
de Dialogo Hebraico – Cristão.
“Portanto estabeleço que o III Domingo do Tempo Comum seja
dedicado à celebração, reflexão e divulgação da Palavra de Deus. Este Domingo
da Palavra de Deus colocar-se-á, assim, num momento propício daquele período do
ano em que somos convidados a reforçar os laços com os judeus e a rezar pela
unidade dos cristãos. Não se trata de mera coincidência temporal: a celebração
do Domingo da Palavra de Deus expressa uma valência ecumênica, porque a Sagrada
Escritura indica, a quantos se colocam à sua escuta, o caminho a seguir para se
chegar a uma unidade autêntica e sólida. (APERUIT ILLIS, Papa FRANCISCO, n.
3).”
Essa celebração, fruto de
muita reflexão do Magistério Universal (Pastores, ministros, teólogos e todo o
Povo de Deus), é uma manifestação propícia, com o fim de fortalecer e recuperar
a identidade cristã, que se consolida no processo de “familiarização” com a
Palavra de Deus. E para isso, a dimensão celebrativa só pode ser frutuosa se
for o cume e fonte de uma vida “frequentada na Sagrada Escritura”, cuja
“Sacramentalidade” (Bento XVI, Verbum Domini, 56) nos motiva à uma
“Primazia da Palavra”, qualquer que seja nosso status, nossas
escolhas e nosso cotidiano.
A história foi testemunha
de muitos desacertos e desentendimentos entre os fiéis. Muitas vezes, o Texto
Sagrado, foi instrumentalizado e reduzido, seja para fundamentar as ideologias,
seja também para mera apologética. Também hoje nos confrontamos com uma
“utilização” supersticiosa e moralista da Santa Palavra, subordinando-a às
fantasias individuais e coletivas, e até mesmo – com triste e indignada
constatação – com o objetivo de domínio político, econômico e social.
Quando a vida não é
alicerçada, alimentada e iluminada pela Palavra, cuja “Primazia” é fundamental,
incorremos nos mesmos erros que a história ainda nos narra, e que se encontram
presentes em nossa sociedade. Isso alerta para a distância em que podemos estar
daquela nossa verdadeira identidade, que se realiza e se concretiza justamente
na “assiduidade” à Sagrada Escritura. Por isso, essa jornada é um forte convite
à Lectio Divina, que no Brasil, foi nominada como “Leitura
Orante da Bíblia”, e muito frutificou nas Comunidades Eclesiais de Base.
A “Lectio” não é
apenas um exercício de piedade, ou “momento de oração” para obter graças,
curas, etc ... Também não é tempo no qual o leitor busca seus interesses
pessoais e tenta encontrá-los na Bíblia. Antes de tudo, a “Lectio” é uma
decisão entre duas pessoas que fizeram uma “Aliança”, um “Pacto de Amor”: Deus
e o homem. E nessa leitura, homem e Deus se encontram no percurso escolhido em
plena liberdade por ambos, em que a Palavra proferida e a Palavra escutada, vai
assumindo carne e presença em uma nova historia, a “Historia da Salvação”.
Mesmo desenvolvida em um
contexto monástico, a Lectio Divina não é privilégio de monges
e monjas. Na experiência de Fé, o cristão que frequenta a Palavra, vai
exprimindo a Imagem de Deus que lhe foi impressa no Batismo, pois, quando duas
pessoas se amam e se “encontram” nesse dialogo de ternura – próprio da leitura
orante - inexoravelmente se adquire aquela palavra de conhecimento
experiencial, que Platão (400 a.C) chamava de syggeneia, isto é,
conaturalidade ou consanguinidade, pois somente os semelhante conhece o
semelhante. É esse o fruto da Lectio! Pela continua frequentação á
Palavra Santa, nós nos tornamos conaturais de Deus, do mesmo modo que Ele se
conaturalizou conosco.
O “Grande” Papa e Doutor
São Gregório (séc. VI), em seus escritos, nos permite confirmar essa realidade
com uma máxima de muito valor para os que decidiram percorrer o caminho
fundamental da Lectio: “Divina eloquia legente crescunt”. “A
Palavra de Deus cresce junto com quem dela se aproxima”. Aquele Jesus que se
esconde e se revela no texto bíblico, é o “Grande Amigo”, melhor, o “Noivo” que
vai desvelando gradualmente à sua amada os seus mais ricos tesouros,
impulsionando-a delicadamente, no pleno respeito da sua liberdade, a aderir à
sua proposta de amor.
O “Domingo da Palavra de
Deus”, celebrado pela primeira vez em nossas comunidades religiosas e
paroquiais, quer ser sinal e apelo para redescobrirmos nossa identidade de
discípulos e discípulas de Jesus, homens e mulheres que escolheram o “Primado”
da Palavra de Deus, que é sempre transformadora, restauradora e vivificadora de
cada ser humano e de toda a sociedade “Quem se alimenta dia a dia da Palavra de
Deus torna-se, como Jesus, contemporâneo das pessoas que encontra; não se sente
tentado a cair em nostalgias estéreis do passado, nem em utopias desencarnadas
relativas ao futuro.” (APERUIT ILLIS, Papa FRANCISCO, n.12).
Para
participar da celebração na Basílica de São Pedro
Para aqueles que desejam
participar da Santa Missa presidida pelo Papa Francisco às 10:00 da manhã
(horário italiano) na Basílica de São Pedro, e os sacerdotes que desejarem
concelebrar com o Santo Padre, poderão solicitar os ingressos gratuitos no
Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, preenchendo o
formulário apropriado no seguinte link: https://is.gd/2JGk6n,
e retirando-os no átrio do Palazzo San Pio X (Via della Conciliazione, 5) nos
seguintes horários: sexta-feira, 24 de janeiro, das 08:30 às 13:30 e das 15:00
às 17:30 / Sábado, 25 de janeiro, das 08:30 às 13:30 e das 15:00 às 17:30 /
Domingo, 26 de janeiro, das 07:00 às 09:00.
Já das 16 às 19 horas do
domingo, na Basílica di Sant’Agnese in Agone, haverá a leitura contínua do
Evangelho de Mateus, proclamado por diversas personalidades.
Ulteriores informações ou
esclarecimentos podem ser encaminhados ao Pontifício Conselho para a Promoção
da Nova Evangelização, no seguinte endereço de e-mail: events@pcpne.va
* Dom Cristiano
Sousa OSB Cam é monge Beneditino da Congregação de Camaldoli, natural
de Guaratinguetá –SP e membro da Comunidade do Mosteiro de São Gregório al
Celio, Roma. Formado em Sacra Teologia pelo Pontificio Ateneo Santo Anselmo de
Roma, atualmente é mestrando em Psicologia Clinica pela LUMSA-Roma.
(vaticannews)
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