Encontro particular do Papa com alguns jesuítas
polacos em Cracóvia durante a jmj
A sua mensagem chega ao coração dos jovens. Como
consegue falar com eles de maneira tão eficaz? Poderia dar-nos alguns conselhos
para trabalhar com os jovens?
Quando falo, devo fitar os olhos das pessoas. Não é
possível fitar os olhos de todos, mas dirijo o olhar para este, esse, aquele...
e todos se sentem vistos. É algo que me sai espontâneo. Assim faço com os
jovens. Mas os jovens, quando falas com eles, fazem perguntas... Hoje no
almoço, formularam-me algumas perguntas... Perguntaram-me até o modo como me
confesso! Eles não têm pudor. Fazem perguntas diretas. E a um jovem precisa
sempre responder com a verdade. Hoje durante o almoço a um dado momento
chegamos a falar sobre a confissão.
Um jovem perguntou-me: «De que modo o senhor se
confessa?». E depois falou-me de si mesmo. Disse-me: «No meu país houve
escândalos ligados aos sacerdotes, e nós não tínhamos a coragem de nos
confessar com o padre que viveu aqueles escândalos. Não consigo». Vede: dizem a
verdade, às vezes repreendem-te... Os jovens falam diretamente. Querem a
verdade, ou pelo menos um claro: «não sei como te responder». Nunca devemos ter
subterfúgios com os jovens. Assim também com a oração. Perguntaram-me: «Como o
senhor reza?». Se responderes com uma teoria, ficam desiludidos. Os jovens são
generosos. Mas o trabalho com eles exige também paciência, muita paciência. Um
deles perguntou-me: «O que devo dizer a um amigo ou a uma amiga que não crê em
Deus para que possa se tornar crente?». Eis: vê-se que às vezes os jovens
precisam de «receitas». Então devemos estar prontos para satisfazer esta
solicitação de receitas e de respostas imediatas. Respondi: «Olha, a última
coisa que deves fazer é dizer algo. Começa por fazer algo. Depois será ele ou
ela que te pedirá explicações sobre como vives e porquê». Portanto, é preciso
ser direto, direto com a verdade.
Qual é o papel da Universidade dos jesuítas?
Uma Universidade dirigida pelos jesuítas deve apostar
numa formação global e não só intelectual, uma formação integral do homem. De
facto, se a Universidade se tornar simplesmente uma academia de noções ou uma
«fábrica» de profissionais, ou se na sua estrutura prevalecer uma mentalidade
centrada nos negócios, então estará deveras fora do caminho. Temos nas mãos os
Exercícios. Eis o desafio: levar a Universidade pelo caminho dos Exercícios.
Isto significa arriscar sobre a verdade e não sobre as «verdades fechadas» que
ninguém debate. A verdade do encontro com as pessoas é aberta e requer que nos
deixemos interpelar pela realidade. E a Universidade dos jesuítas deve
participar também na vida real da Igreja e da nação: com efeito, também esta é
realidade. Uma atenção particular deve ser dada sempre aos marginalizados, à
defesa de quantos têm necessidade de ser protegidos. E isto – que seja claro –
não é ser comunista: é simplesmente participar deveras na realidade. Neste
caso, em particular uma Universidade dos jesuítas deve participar plenamente na
realidade exprimindo o pensamento social da Igreja. O pensamento liberal, que
tirou o homem do centro e ali pôs o dinheiro, não é o nosso. A doutrina da
Igreja é clara e é preciso continuar neste sentido.
Por que se tornou jesuíta?
Quando entrei no seminário, já sentia uma vocação
religiosa. Mas naquele tempo o meu confessor era antijesuíta. Eu gostava também
dos dominicanos e da sua vida intelectual. Depois adoeci, tive que passar por
uma intervenção cirúrgica num pulmão. Em seguida, outro sacerdote ajudou-me
espiritualmente. Recordo que quando contei ao primeiro que entrava nos jesuítas
ele não gostou muito. Mas neste ponto agiu a ironia do Senhor. De facto,
naquele tempo recebiam-se as Ordens menores. A tonsura era feita no primeiro
ano de teologia. O reitor disse-me para ir a Buenos Aires falar com o bispo
auxiliar, D. Oscar Villena, e pedir-lhe que viesse celebrar a cerimónia da
tonsura. Fui à Casa do clero, mas disseram-me que D. Villena tinha adoecido. No
seu lugar estava outro prelado, que era exatamente aquele primeiro sacerdote
que depois se tornara bispo! E precisamente dele recebi a tonsura! E fizemos as
pazes depois de tantos anos... De qualquer forma, a minha escolha pela
Companhia, posso dizer, amadureceu sozinha...
Neste grupo há alguns sacerdotes que acabaram de ser
ordenados. Daria algum conselho para o futuro deles?
Sabe: o futuro é de Deus. O máximo que podemos fazer é
ser futuristas. E os futuristas são todos do espírito maligno! Um conselho: o
sacerdócio é uma graça deveras grande; o teu sacerdócio como jesuíta seja
permeado da espiritualidade que viveste até agora: a espiritualidade do Suscipe
de santo Inácio.
[Neste momento parece que o encontro termina com a
entrega ao Pontífice dos dons por parte de alguns jesuítas que seguiram os
jovens ligados à espiritualidade inaciana, provenientes de todo o mundo para a
jmj. Contudo, Francisco desejou acrescentar uma recomendação, e todos se
sentaram de novo].
Gostaria de acrescentar algo. Peço-vos
que trabalheis com os seminaristas. Sobretudo dai-lhes o que recebemos dos
Exercícios: a sabedoria do discernimento. Hoje a Igreja precisa de crescer na
capacidade de discernimento espiritual. Alguns planos de formação sacerdotal
correm o perigo de educar à luz de ideias demasiado claras e distintas, e por
conseguinte, de agir com limites e critérios definidos rigidamente a priori, e
que prescindem das situações concretas: «Deve-se fazer isto, não se deve fazer
aquilo...». Portanto, os seminaristas que se tornam sacerdotes encontram-se em
dificuldade ao acompanhar a vida de muitos jovens e adultos. Porque tantos
perguntam: «Isto pode-se ou não se pode?». Eis tudo. E muitas pessoas saem do
confessionário desiludidas. Não porque o sacerdote seja mau, mas porque ele não
tem a capacidade de discernir as situações, de acompanhar no discernimento autêntico.
Não teve a formação necessária. Hoje a Igreja precisa de crescer no
discernimento, na capacidade de discernir. E sobretudo os sacerdotes têm
necessidade disto para o seu ministério. Por isso é preciso ensinar os
seminaristas e os sacerdotes em formação: habitualmente eles receberão as
confidências da consciência dos fiéis. A direção espiritual não é só um carisma
sacerdotal, mas também laical, é verdade. Mas, repito, é preciso ensinar isto
sobretudo aos sacerdotes, ajudá-los à luz dos Exercícios na dinâmica do
discernimento pastoral, que respeita o direito mas sabe ir além. Esta é uma
tarefa importante para a Companhia. Comoveu-me muito um pensamento do padre
Hugo Rahner. Ele pensava e escrevia com clareza! Hugo dizia que o jesuíta
deveria ser um homem com a intuição do sobrenatural, isto é, deveria ser dotado
de um sentido do divino e do diabólico relativo aos eventos da vida humana e da
história. Por conseguinte, o jesuíta deve ser capaz de discernir quer no campo
de Deus quer no do diabo. Por isso nos Exercícios santo Inácio pede que sejamos
introduzidos tanto nas intenções do Senhor da vida como nas do inimigo da
natureza humana e nos seus enganos. É audaz, é audaz o que escreveu
verdadeiramente mas o discernimento é precisamente isto! É preciso formar os
futuros sacerdotes não para ideias gerais e abstratas, que são claras e
distintas, mas para esta finalidade do discernimento dos espíritos, para que
possam deveras ajudar as pessoas na sua vida concreta. É preciso compreender
que na vida nem tudo é preto no branco ou branco no preto. Não! Na vida
prevalecem as tonalidades cinzentas. Então é necessário ensinar a discernir
neste cinzento.
(osservatoreromano)
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