sábado, 11 de junho de 2016

FINALMENTE APÓSTOLA


Desde há quase dois mil anos era evidente para todos a presença decisiva diante do sepulcro vazio de Maria Madalena, a primeira que deu a boa nova da ressurreição: precisamente ela, uma mulher.
Mas parecia deveras que ninguém se tinha apercebido. Ao longo dos séculos surgiram até histórias misóginas, como aquela segundo a qual que Jesus tinha aparecido antes de tudo a uma mulher porque as mulheres falam mais e assim a notícia ter-se-ia difundido mais depressa. Além disso, alguns importantes comentadores tinham-se questionado sobre como o ressuscitado tivesse descuidado a sua mãe, chegando até a imaginar uma aparição a Maria antes do encontro com Madalena, de modo a restabelecer uma hierarquia que se considerava alterada.
Sobre Maria de Magdala, precisamente devido à sua evidente proximidade a Jesus, tinham até surgido vozes preocupantes, a ponto de fazer dela o símbolo da transgressão sexual, relançado por lendas tenazes, ainda hoje vivas: muitos recordam a Madalena no filme de Martin Scorsese A última tentação de Cristo, e certamente muitos mais leram O código da Vinci, best seller fundado precisamente sobre o presumível segredo do matrimónio entre ela e Jesus.
De resto Madalena é a única protagonista importante da história sacra a ser representada um pouco seminua na iconografia, e quase sempre com os cabelos ruivos, por muito tempo considerados sinal de desordem sexual. Em síntese, mesmo se era considerada santa, era representada quase como símbolo oposto à imagem virginal de Maria, vestida de branco e de azul. A ponto que entre as feministas dos anos Setenta começou a difundir-se o costume de chamar Madalena às suas filhas, em sinal de rebelião à tradição religiosa. Ao contrário foi mais clarividente a tradição popular, que imaginou uma sua viagem por mar até ao litoral meridional da França: para evangelizar, precisamente como os outros apóstolos, uma parte do mundo então conhecido. Foi tão longo e difícil o caminho que levou à aceitação da verdade, uma verdade simples mas expressiva de uma mensagem que muitos não queriam ouvir: ou seja, que para Jesus as mulheres eram iguais aos homens sob o ponto de vista espiritual, porque têm o mesmo valor e capacidades. Por isso era tão difícil admitir que Madalena era uma apóstola, a primeira entre os apóstolos aos quais o Senhor ressuscitado se manifestou. Por isso precisamente ela, ou melhor, da restituição do lugar que lhe compete na tradição cristã, pode partir finalmente o reconhecimento do papel das mulheres na Igreja. O Papa Francisco compreendeu claramente, e iniciou deste modo um processo que nunca mais poderá ser interrompido.
Surpreende que a data do documento seja a do dia no qual se celebra o Sagrado Coração de Jesus: uma devoção difundida por uma mulher, Margarida Maria Alacoque, e relançada com paixão por muitas santas do século XIX, como Francisca Cabrini. Estas são outras confirmações de que as mulheres sempre estiveram na Igreja, desempenharam papéis importantes e contribuíram para a construção da tradição cristã.
Então, da parte de todas as mulheres cristãs do mundo, um obrigado ao Papa Francisco, porque com a criação da nova festa de Santa Maria Madalena lhes reconhece o mérito.
Lucetta Scaraffia
(osservatoreromano)



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