sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Cavaco mantém reservas quanto à estabilidade e à durabilidade do governo do PS e lembra que só não tem o poder de dissolver a AR. Mas pode demitir governos.



Cavaco Silva deu ontem posse ao XXI Governo Constitucional, liderado por António Costa, mas não está absolutamente seguro de que a solução alternativa à do governo de coligação PSD/CDS – que venceu as eleições, formou governo e viu rejeitado o seu programa no parlamento – garanta as condições de “durabilidade” que o Presidente da República (PR) entende fundamentais para que esta legislatura não seja interrompida a meio.

O _PR está em final de mandato, mas nem por isso se pense que Belém perde força até ser eleito (24 de Janeiro) o substituto de Cavaco. O_próprio fez questão de lembrar que apenas um dos seus poderes se encontra “cerceado”:_o de dissolver o parlamento e convocar novas eleições. Mas pode demitir governos. Ou seja, pode demitir Costa, que chega a primeiro-ministro com o apoio do BE, do PCP _e do PEV. 



E o aviso ganha particular relevo quando Cavaco assume que mantém reservas quanto à solução apresentada por “quatro forças políticas [que] assinaram três documentos de diferente alcance designados por ‘posições conjuntas’”, naquilo que lembrou ser uma “solução inédita na história” da democracia portuguesa. E acrescentou, para memória futura ou para ajudar a sustentar alguma decisão que ainda venha a tomar antes de deixar Belém: “Os referidos documentos são omissos quanto a alguns pontos essenciais à estabilidade política e durabilidade do governo, suscitando questões que, apesar dos esforços desenvolvidos, não foram totalmente dissipadas.”

Para Cavaco, o governo do PS que iniciou agora funções, depois de derrubar o governo de coligação que tomou posse a 30 de Outubro, é um “governo minoritário” que se formou a partir de uma “crise política” pela qual é responsável e cuja “estabilidade” e “durabilidade” está nas mãos dos partidos que o viabilizaram, os mesmos a que é a conferida a “responsabilidade pelo governo que é hoje empossado”, frisou o PR. 



Foi um discurso de confronto, cheio de recados e com um caderno de encargos claríssimo. Cavaco, que fez questão de lembrar que foi eleito por sufrágio universal e directo dos portugueses, prometeu estar vigilante e será o primeiro guardião da herança de Passos Coelho (“Não podemos regredir num caminho que foi árduo, em que foram pedidos muitos sacrifícios aos portugueses”). Sobretudo em matéria de Orçamento, sobre a qual o PR deixou uma garantia: “Tudo farei para que o país não se afaste da actual trajectória de crescimento económico e criação de emprego e preserve a credibilidade externa.” Até porque, avisou, “é uma ilusão pensar que um país como Portugal pode prescindir da confiança dos mercados financeiros e dos investidores externos e, bem assim, do apoio das instituições internacionais”. Alguém falou em não respeitar as regras europeias, como o Tratado Orçamental e o Pacto de Estabilidade e Crescimento? Cavaco, pelo sim pelo não, deixa um lembrete:_“Trata-se de compromissos de Estado que a Assembleia da República sufragou por esmagadora maioria.”

Esquerda demarca-se As considerações de Cavaco Silva a propósito de futuras relações institucionais entre a presidência e o governo mereceram a condenação unânime à esquerda. Em reacção ao discurso de Cavaco Silva, o líder parlamentar socialista, Carlos César, defendeu que o governo agora empossado “não é o resultado de uma divergência”, nem de “uma crise”, como defendeu o PR, mas de uma “convergência” e da “vontade de fazer um país melhor”. Sobre a relação institucional entre Presidente da República e governo, que Cavaco ameaçou manter tensa, o líder parlamentar socialista disse que é importante que seja uma boa relação, mas afirmou também que “não totaliza a estabilidade política e a conjugação de esforços necessária” e que o governo deve concentrar muito do seu tempo “nos problemas do país e não perder tempo nos conflitos institucionais, que são inúteis”.



Também a líder do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, considera que o PR continua a incorrer num “equívoco” quanto à formação deste governo: “O PR optou por fazer o país ter esse compasso de espera, mas o governo que é agora indigitado é o governo que vem, não de uma crise política, mas sim da legitimidade das eleições de dia 4 de Outubro, que representa a nova maioria da Assembleia da República e um acordo para parar o empobrecimento em Portugal”, disse.



Já João Oliveira, o líder da bancada parlamentar do PCP, considerou “grave e preocupante” que o Presidente ainda tivesse ponderado “outras soluções”, nomeadamente manter “em funções de gestão” o governo de Passos Coelho. Manuela Cunha, do PEV, quando interrogada sobre os “recados” do PR ao governo, disse que não estava ali para “ouvir recados”. 

(ionline.pt)


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