Ariccia (RV) - O risco de perder a fé, o
suicídio e a missão da Igreja em busca dos pecadores: foram os temas candentes
sobre os quais se deteve o pregador dos Exercícios espirituais, Pe. Giulio
Michelini, na quinta meditação proposta ao Papa e à Cúria Romana, reunidos
deste domingo passado na localidade de Ariccia, próximo de Roma. A reflexão da
manhã desta quarta-feira (08/03) foi centralizada na figura de Judas.
De fato, a meditação matutina
do frade menor girou em torno do drama do suicídio de Judas, um dos Doze. Um
evento escandaloso e desconcertante, que porém o Evangelho não esconde. Um
drama evidenciado também pelo arrependimento de Judas que no Evangelho segundo
São Mateus reconhece ter pecado porque traiu sangue inocente.
Judas e nós: o risco da perda
da fé
Em seguida, o
pregador buscou reconstruir os motivos que podem ter levado Judas a trair
Jesus, que o havia escolhido e chamado. E Judas o havia seguido. Para entender
o seu drama, Pe. Michelini releu textos de estudiosos e escritores. De Romano
Guardini a Amós Oz, que dedicaram páginas a esta figura. A primeira hipótese é
que Judas a um certo ponto tenha perdido a fé. Um risco a partir do qual todos
devem se perguntar:
“Há por acaso em
minha vida muitos dias em que não abandonamos Cristo – nosso saber melhor,
nosso amor – por uma vaidade, uma sensualidade, um ganho, uma segurança, um
ódio, uma vingança? Temos poucas justificativas para falar com indignação sobre
o traidor. Judas revela nós mesmos.”
O pregador evocou a
experiência do escritor francês Emmanuel Carrère e o seu livro “O Reino”, de
2014, no qual conta ter novamente abraçado a fé durante três anos e depois
tê-la perdido outra vez. Emerge o trabalho interior de um homem que, porém,
escreve: “Abandono-te, Senhor. Tu, não me abandones.”
Foi levantada outra
hipótese sobre a traição de Judas: Judas queria que Cristo se mostrasse como o
Messias de Israel, libertador, combatente, político. Por conseguinte, não via
mais no rosto de Jesus o Senhor, mas apenas um Rabi, um Mestre, e quer forçá-lo
a fazer aquilo que ele deseja.
Sair
pelas ruas a buscar os pagãos e os publicanos
A segunda reflexão
que a meditação matutina quer provocar é sobre o que se pode fazer por quem se
encontra distante da fé. É preciso sair à procura dos pecadores, recordou o
franciscano que contou uma experiência:
“Vivo com uma
comunidade de jovens que fazem duas missões populares por ano. Brinco com eles
porque saem para dançar, entram nas discotecas e vão aos pubs. Eu,
naturalmente, como professor não me permitiria fazer algo assim e, portanto,
brinco com meus frades. E são muitos anos, desde que ensino, que não faço
missões populares. Mas eles sabem quanta estima tenho pelo fato de ter alguém
que vai ali aonde há isso que não queremos ver, há jovens quem sabe
desesperados... Portanto, mesmo se não fazemos isso, devemos ser realmente
gratos e solidários para com aqueles que saem pelas ruas a buscar, como dizia
Jesus, os pagãos e os publicanos.”
O percurso de Judas
levou-o ao suicídio após dar-se conta de seu pecado, observou o frade. Na obra
“Os noivos” de Alessandro Manzoni é emblemática, nesse sentido, a conversão do
Apaixonado que tem a tentação de tirar a própria vida, até que ouviu o repicar
dos sinos. Retornam a sua memória as palavras de sua amada Lúcia sobre Deus que
perdoa tantas coisas por uma obra de misericórdia. Em seguida – ainda citando
Manzoni –, tem lugar o encontro com o Cardeal Federigo Borromeo, que lamenta
não ter sido ele por primeiro a ir encontrá-lo. São páginas de fé, que convidam
a ir em busca dos pecadores, ressaltou.
Foram também
evocadas palavras do Papa Francisco numa homilia da missa na Casa Santa Marta,
quando a propósito dos sacerdotes que rechaçam Judas, falou do clericalismo:
Judas foi descartado, traidor e arrependido não foi acolhido pelos pastores que
eram intelectuais da religião com uma moral feita a partir da sua inteligência
e não da revelação de Deus.
Os
suicídios do nosso tempo. Ajudar os cristãos a não perder a fé
E falando do
suicídio de Judas, Pe. Michelini não esqueceu a atualidade com os suicídios
assistidos e os suicídios de jovens. Daí, o ponto de agarra para uma pergunta
dirigida aos pastores:
“Como podemos
ajudar os cristãos do nosso tempo a não perder a fé, a retomar consciência da
própria fé, aquela da qual se fala no Novo Testamento, a fé alegre,
totalizadora, a adesão à pessoa de Jesus, o que podemos fazer para que não mais
ocorram esses suicídios?”
Tratou-se de uma
meditação com traços fortemente existenciais sobre a fé, sobre nossas
interpelações e sobre a missão da Igreja no mundo.
(RL / DD)
-->
radiovaticana
Sem comentários:
Enviar um comentário