Discurso do Santo Padre, Bento XVI, preparado para a visita à Universidade “La Sapienza”
(Continuação)
Retornando à pergunta de partida. O Papa fala como representante de uma comunidade crente, na qual durante séculos da sua existência amadureceu uma determinada sapiência da vida; fala como representante de uma comunidade que tem consigo a custódia de um tesouro de consciência e de experiência ética importante para toda a humanidade: neste sentido fala como representante de uma razão ética.
Mas agora nós devemo-nos perguntar:
E que coisa é a universidade? Qual a sua missão?
É uma pergunta gigantesca à qual, mais uma vez, posso tentar responder apenas em estilo quase telegráfico com algumas observações. Penso que se possa dizer que a verdadeira, íntima origem da universidade esteja no desejo ardente de consciência que é próprio do homem. Ele quer saber o que é tudo que o rodeia. Quer verdade. Neste sentido pode ver-se a interrogação de Sócrates como o impulso de que nasceu a Universidade ocidental.
Penso, por exemplo - para mencionar apenas um texto – na disputa com Eutifrone, que perante Sócrates defende a religião mítica e a sua devoção. A isto, Sócrates contrapõe a pergunta: “Tu crês que entre os deuses, exista realmente uma guerra, vencedores, terríveis inimigos e combates... Devemos, Eutifrone, efectivamente dizer que tudo isto é verdadeiro?” (6 b – c). Nesta pergunta aparentemente pouco devota – que, porém, em Sócrates derivava de uma religiosidade mais profunda e mais pura, da busca do Deus verdadeiramente divino – os cristãos dos primeiros séculos reconheceram-se a si próprios e ao seu caminho. Tinham acolhido a sua fé não de um modo positivista, ou como a via de saída de desejos não apagados; compreenderam como a dissolução da névoa da religião mitológica para dar lugar à descoberta de que Deus é Razão criadora e ao mesmo tempo Razão-Amor. Por isto, o interrogar-se da razão sobre um Deus maior, e também sobre a verdadeira natureza e o verdadeiro sentido do ser humano era para eles não uma forma problemática de falta de religiosidade, mas fazia parte da essência do seu modo de serem religiosos. Não tinham necessidade, portanto, de escolher ou acantonar o interrogar-se socrático, mas podiam, melhor, deviam acolher e reconhecer como parte da própria identidade a busca fatigante da razão para atingir a consciência da verdade inteira.
Penso, por exemplo - para mencionar apenas um texto – na disputa com Eutifrone, que perante Sócrates defende a religião mítica e a sua devoção. A isto, Sócrates contrapõe a pergunta: “Tu crês que entre os deuses, exista realmente uma guerra, vencedores, terríveis inimigos e combates... Devemos, Eutifrone, efectivamente dizer que tudo isto é verdadeiro?” (6 b – c). Nesta pergunta aparentemente pouco devota – que, porém, em Sócrates derivava de uma religiosidade mais profunda e mais pura, da busca do Deus verdadeiramente divino – os cristãos dos primeiros séculos reconheceram-se a si próprios e ao seu caminho. Tinham acolhido a sua fé não de um modo positivista, ou como a via de saída de desejos não apagados; compreenderam como a dissolução da névoa da religião mitológica para dar lugar à descoberta de que Deus é Razão criadora e ao mesmo tempo Razão-Amor. Por isto, o interrogar-se da razão sobre um Deus maior, e também sobre a verdadeira natureza e o verdadeiro sentido do ser humano era para eles não uma forma problemática de falta de religiosidade, mas fazia parte da essência do seu modo de serem religiosos. Não tinham necessidade, portanto, de escolher ou acantonar o interrogar-se socrático, mas podiam, melhor, deviam acolher e reconhecer como parte da própria identidade a busca fatigante da razão para atingir a consciência da verdade inteira.
Podia, antes devia, assim, no âmbito da fé cristã, no mundo cristão, nascer a universidade. É necessário dar um passo ulterior. O homem quer conhecer – quer verdade. Verdade é, antes de mais, uma coisa do ver, do compreender, da theoria, como lhe chama a tradição grega. Mas a verdade não é apenas teórica.
( Continua)
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