Discurso do Santo Padre, Bento XVI, preparado para a visita à Universidade “La Sapienza”
Jürgen Habermas exprime, na minha opinião, um vasto consenso do pensamento actual, quando diz que a legitimidade de uma carta constitucional, qual pressuposto da legalidade, deriva de duas fontes: da participação política igualitária de todos os cidadãos e da forma razoável pela qual os contrastes políticos se resolvem. Em relação a esta “forma razoável” ele nota que essa não pode ser só uma luta por uma maioria aritmética, mas deve caracterizar-se como um “processo de argumentação sensível à verdade (wahrheitssensibles Argumentationsverfahren). Está bem dito, mas é muito difícil transformar isto numa praxis política. Os representantes daquele “processo de argumentação” público são – sabemo-lo – prevalecentemente os partidos como responsáveis da formação da vontade política. De facto, esses terão inevitavelmente em mira, sobretudo a obtenção de maiorias e quase inevitavelmente os interesses que prometem satisfazer; tais interesses são, muitas vezes, particulares e não servem verdadeiramente
ao conjunto. A sensibilidade para a verdade é sempre de novo subjugada pela sensibilidade para os interesses. Eu acho significativo o facto que Habermas fale da sensibilidade pela verdade como elemento necessário no processo de argumentação política, reinserindo assim o conceito de verdade no debate filosófico e no debate político.
Mas agora torna-se inevitável a pergunta de Pilatos: O que é a verdade? E como se reconhece?
Se por isto se re-envia à “razão pública”, como faz Rawls, segue-se necessariamente ainda a pergunta: O que é razoável? Como é que uma razão se demonstra como razão verdadeira?
Em qualquer caso, torna-se evidente que, na busca do direito da liberdade, da verdade da
justa convivência devem ser auscultadas instâncias diversas com respeito a partidos e grupos de
interesse, sem com isto querer minimamente contestar a sua importância.
Voltemos assim à estrutura da universidade medieval. Ao lado da Faculdade de jurisprudência estavam as Faculdades de filosofia e de teologia, a quem era confiada a investigação sobre o ser homem na sua totalidade e com isto a tarefa de ter esta sensibilidade pela verdade. Poderse-ia dizer, deveras, que este é o sentido permanente e verdadeiro de ambas Faculdades: serem guardiãs da sensibilidade pela verdade, não permitir que o homem seja desviado da busca da verdade. Mas como podem elas corresponder a esta tarefa? Esta é uma pergunta na qual é preciso laborarmos constantemente e que não é nunca colocada e resolvida definitivamente. Assim, neste ponto nem sequer eu posso oferecer propriamente uma resposta, mas antes um convite a permanecer em caminho com esta pergunta – em caminho com os grandes que ao longo de toda a história lutaram e procuraram, com as suas respostas e as suas inquietações pela verdade, que permanece continuamente do lado de lá de cada resposta singular.
(Continua)
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